terça-feira, 20 de agosto de 2013

Bagagem

Deve-se pensar
se a experiência advinda da idade
não acaba por matar 
a esperança dos mais velhos.
Aprofundemos e pensemos 
se acaso não é a impulsividade da juventude
que move o mundo,
pois no jovem
o medo de errar 
é diretamente proporcional
à quantia de verões.

Não desfaço da bagagem
que trazes,
menos jovem senhor,
mas questiono
se esta mala abarrotada de medos e experiências
não pesa demais
quando precisas correr para pegar o trem.
Nós,
mais jovens,
carregamos cargas mais leves
de experiências talvez menos experientes,
e dramas mais intensos.

Nós, mais jovens,
trazemos os olhos rasos d'água,
somos propensos a derramar mais lágrimas,
talvez por sermos menos embrutecidos.

E acaso não são as águas
que movem os moinhos?

Alegre-se, senhor,
por nossa carga ser mais leve.
Não, não nos menospreze.

No fundo
somos todos jovens,
mas nós,
mais jovens,
somos mais leves,
quase lebres
a tentar saltar sobre os muros
que rodeiam tua essência.

Obrigada por tudo que ensinastes,
senhor.
Tuas experiências muito nos valem,
mas nossas esperanças muito nos movem.

Venha, senhor,
alivie-se um pouco de sua bagagem.
O trem logo parte,
e queremos nós todos dentro dele.
A estação final ainda não está definida,
mas tem um nome qualquer
quase semelhante a "vida".
Se não me engano, senhor,
a estação é Primavera.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Escaras que libertam,
Escadas que elevam,
Estafas que ensinam,
Eis-me aqui, 
Aprendiz da vida.

O sangramento não é mais
Que pulso firme de vida
A correr pelo corpo
E além deste.
As palavras nada mais são
Que ventos dirigidos
a partidos
E razões.

Não sou barreira
Para impedir que teu olhar me atravesse.
Não sou ribeira
A escoar para ti
As águas que brotam de mim.

Mas sou vida
E ampla
Viga
Manta
Que te cobrirá
Quando de acalanto precisar.

Sou céu,
Seu,
Um mel
nem tão doce assim.
Bem-querer de mim.

domingo, 18 de agosto de 2013

Declaração

Meu amor,
Que seria de mim
Se, sem ti,
Eu vivesse?

Que mais poderia sentir
Fruto desse amor
Que flui livre
Em teus olhos
Nos quais
Meus olhos repousam?

Em teu colo encontrei alento
Em teu alento encontrei-me jovem
Fruto da sede de bem querer-te.

És meu repouso,
Minha mortalha.
Qualquer serenata que valha
Um sorriso teu.

Encontro-te
Em cada brisa a refrescar-me a face
Pois que carregas
O frescor dos tempos
Distantes.

Como é bom
Sermos
Amantes.

Mesmo que não saibas
De todo o meu carinho
Entenda que sozinho
Não poderei me deixar viver.
Visto que teu ar
Segreda em meus pulmões
A vida que em ti
Corre em serpentina.
Sozinha
Jamais estarás.

É teu meu canto,
Meu rebanho,
Meu infantil medo
De te perder.

É tua a minha alma
Assombrada e cansada
Extasiada ao te observar de longe.

São tuas minhas carícias
Tímidas
E com a malícia
Que só eu,
Pretencioso,
Te entrego.

Me entrego.

Sou teu,
Amor meu,
prisioneiro liberto
de teu manhoso coração

terça-feira, 13 de agosto de 2013

O filho do seu Amaro

Caminhava, embebecido pela noite, o filho do seu Amaro. O filho partia sozinho em busca de respostas que antes não lhe foram respondidas. Como era imenso o céu que pairava sobre ele. Sentia alguma falta do grande amor que perdera meses atrás, vítima de uma paixão avassaladora que a havia levado para longe dali. Os boatos diziam que ela estava no Piauí. E ele ali, filho, extremamente admirado pelas estrelas. Seu Amaro não sabia mais o que fazer; sabia que seu filho não enlouquecera com a partida do grande amor, porque sempre fôra louco. Mas como podia ele ainda sorrir, sendo vítima dos buchichos das janeleiras do bairro? Seu Amaro não entendia como podia seu filho sentar com os mexeriqueiros plantonistas e colocar-se a rir de si mesmo na companhia dos outros.
O filho do seu Amaro não derrubara uma lágrima. Simplesmente abaixara a cabeça enquanto seu amor negava o amor que ele sempre lhe dera. Ele apenas sorria. E enquanto mostrava os dentes, sua noiva reclamava do seu sempre sorriso. Ele vivia sorrindo. E como ela poderia conviver com alguém que só sabia sorrir? Tal pessoa jamais seria levada a sério. Sendo ela moça séria e direita, comportada e de sandália, não poderia conviver com um risonho. Talvez por isso tenha se apaixonado por um soldado.
Quando ela partiu, o filho do seu Amaro sentiu um vazio. Mas este logo foi preenchido pelo brilho das estrelas que habitavam o céu do interior. Ele nunca tinha se dado conta de quantas estrelas moravam na imensidão do firmamento. Em sua cabeça juntou o brilho de cada uma delas e percebeu que o vazio agora era mais iluminado do que os olhos do seu amor. Descoberto isso, de pronto seu coração sossegou. Mas seu Amaro não sossegava. Sabia que não era normal uma dor de amor se curar tão rápido. Sabia disso porque ainda carregava consigo a dor da partida da esposa. Esta fôra para um lugar mais longe que o Piauí, um lugar de vários nomes, muitos lugares e nenhuma certeza. Uma partida sem volta.
E seu Amaro se preocupava. Puxava qualquer assunto mórbido para conversar com o filho: das tragédias do jornal das oito à queda do dólar. Mesmo assim, diante das mais trágicas histórias, o filho sorria, afligindo ainda mais o pai. Se antes já era louco, o que haveria de ser agora?
Porém, o filho continuava a sorrir. Ria da preocupação excessiva de seu Amaro. Sorria, porque sorrir foi o único remédio que lhe restara, diante de todas as preocupações e desassossegos que antes lhe rasgaram a alma. Entendia que a vida era caminho sem volta. Caminho duro, pesado , mas era o único caminho que existia. Afinal, se podia sorrir, era sinal de que estava vivo... E caminhando. Sorte a dele que no seu caminho existia a noite com suas estrelas a preencher o vazio. Caminhava sorrindo.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Senhora

Ah, Senhora,
que grande talento 
para enganos, não?

Que falsa esperança
seus olhos 
me deram, Senhora.

Senhora Infelicidade, Senhora.

Por que tamanha
falsidade,
Senhora?

Qual o motivo
para tanta injustiça,
Prezada Senhora?
Agora,
após tantas horas,
um tapa assim pelas costas
não é coisa que se faça.

O que aconteceu
afinal,
Senhora,
para agir assim
de maneira tão indecorosa?

Acaso está perdida, Senhora?
Logo a Senhora,
que carregava meu coração na mão?

Que erro cometeste,
Senhora.
Logo quando estava quase
passando no teste.

Que tola esperança
tive em ti,
Senhora.

Azar o seu,
Senhora,
que não sabe o que perdeu.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Conselho

Não discordo que a pressão sofrida
possa servir como justificativa.
Mas há que se ter força para assumir
os riscos de servir
a poucos que pouco toleram,
a alguns fracos que pouco suportam.

Sirva pensando na maioria que é forte,
embora ainda não saiba 
o tamanho de sua força.
Pois aqueles que pouco se conhecem
somam-se
em busca de conhecer ao máximo
tudo aquilo que os rodeia.

Talvez o preço pelo auto-desconhecimento
seja conhecer as mazelas do próximo,
sem perceber que as mazelas dele
estão muito presentes em nós mesmos.

Somos um,
em mazelas,
desassossegos
e desaforos.

O mundo já é um sufoco sem tamanho,
então por que fazer dele algo pior?

Sirva aos fortes que se acham fracos,
governe pelos desconhecidos,
mas não se esqueça daqueles
que querem sua derrota.
Não por vingança
ou qualquer falta de esperança,
mas por saber que,
se deixar o mundo nas mãos destes,
o mundo não terá mais jeito.

Lide e assuma
todos os seus defeitos,
mas lembre-se que respeito
jamais pode faltar.