domingo, 6 de maio de 2012

Num parque, com toda a juventude...


Está difícil começar este texto, ainda mais quando uma confusão de sentimentos fazem suas mãos tremerem ao tentar transcrever o que significou o dia 5 de maio de 2012. Até inventarem uma máquina do tempo, sei que não poderei reviver este dia, mas nada me impedirá de relembrá-lo sempre.
São Paulo é a cidade dos meus sonhos, talvez por ter vivido momentos maravilhosos aqui. Apesar de tudo que falam da cidade, vi em SP coisas maravilhosas acontecerem: vi uma mulher comprando comida para dar a um cachorro e a um morador de rua; vi a cultura brasileira ser valorizada por pessoas de todas as idades; vi um céu azul espetacular, resistindo contra toda a poeira que saía dos escapamentos. E ontem vi o que acredito ser a maior e a mais difícil homenagem que uma filha poderia fazer para uma mãe, mesmo sem ter convivido muito com esta. Vi, também, uma das maiores homenagens que um profissional poderia fazer a outro. Ontem vi e sobrevivi a Maria Rita cantando Elis, de uma maneira que só ela teria autoridade para fazer.
Qualquer palavra é pouca para dizer o que foi aquele momento. Com mais de 120 mil pessoas no Parque da Juventude, o momento foi diferente para cada uma delas, a emoção talvez tenha sido parecida. De qualquer maneira, foi estrondoso o respeito que se teve com a filha, com a mãe e com toda aquela energia que circulava e limpava o local onde ocorrera um dos maiores massacres da história. As canções de luta retrataram bem o chão no qual pisávamos e ninguém se calou sobre os corpos que ali se deitaram há alguns anos. As mãos se levantaram e, juntamente com os olhos vidrados da cantora, dirigidos e fixados a um ponto qualquer, todos se concentraram na letra que clamava por justiça.
Ao entrar no palco, percebeu-se que a filha e a cantora estavam emocionadíssimas. Uma, sentindo a leveza pesada da grandiosidade da mãe. A outra sentia a energia daquele público gigantesco que a aplaudia e vibrava com a força e coragem que demonstrava. De qualquer modo, não foi fácil para ninguém. Nem para Maria, nem para o público. Particularmente, para mim foi ainda mais difícil, não sei ao certo o porquê. Canções que eu já entendia, que já me sensibilizaram alguma outra vez, trouxeram à tona todos os sentimentos que eu desejava exprimir e não conseguia. Especialmente “Se eu quiser falar com Deus” e “Romaria”, que me ajudaram a restabelecer um contato que eu estava perdendo com o divino. Enfim, foi um espetáculo no qual se juntaram os sentimentos mais necessários ao indivíduo humano: dedicação, amor, paixão, justiça, fé, esperança e alegria.
Após ”O Bêbado e a Equilibrista”, quando falava da grande mulher que fôra Elis Regina, Maria Rita acertou em cheio. Aliás, seria difícil não acertar. De fato, Elis “não foi só um rostinho bonito e uma voz afinada”, foi uma guerreira. E foi isso o que eu disse e que MR repetiu, me deixando radiante, não nego. Pena que não falei guerreiraS, com um “S” bem grande no final, porque Elis e Maria são. Elis demonstrou sua força em um tempo de torturas físicas, psicológicas, perseguições. Maria demonstrou sua força num tempo muito parecido com o passado, disfarçado de “democrático”, mas com perseguições mascaradas tão duras quanto as outras.
Realmente foi um espetáculo muito além de especial que pude dividir com pessoas especiais para mim. Foi algo necessário, extremamente necessário para a música não só brasileira, e sim mundial; para Elis, para os filhos, para o público, fãs e para mim. Acreditem: ainda existe muito amor em São Paulo.